Fábrica Viúva Lamego (azulejos da fachada), Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha (cerâmica relevada), Francisco Vilaça (pintor), Columbano Bordalo Pinheiro (pintor), Maria Augusta Bordalo Pinheiro (pintora), Rafael Bordalo Pinheiro (escultor-ceramista
Pequena quinta de recreio, a quinta do Beau-Séjour destaca pelo seu enquadramento de frondosos jardins que lhe conferem um ambiência marcadamente romântico. Da primeira proprietária, a Viscondessa da Regaleira, a casa recebe com os barões da Glória grandes obras de que se destacam os azulejos que passaram a cobrir todas as fachadas imprimindo ao edifício uma vertente de gosto revivalista. Nos seis interiores a quinta guarda a sua estrutura novecentista tendo recebido uma campanha de pintura a cargo de Columbano Bordalo Pinheiro de inegável valos patrimonial.
Inserido na malha da cidade, no interior de um lote murado, o edifício é circundado pelo jardim a toda a volta. Implantado numa zona sobre-elevada em relação à rua, o palacete está localizado na zona nordeste da quinta, afastado 40 metros da Estrada de Benfica, com acesso pelo nº 368. O terreno com o jardim até à fachada é plano e após o palacete entra em declive ascendente de Sul para Norte. Pertence à freguesia de São Domingos de Benfica.
A morfologia do edifício assenta na composição de um prisma rectangular regular, com dois volumes quadrangulares adossados às fachadas laterais, elevando-se acima do piso térreo, constituindo-se como dois torreões colaterais. Estes apresentam telhado de duas águas, visualmente imperceptíveis pela platibanda que remata o seu topo. O corpo central tem a cobertura com quatro águas que correspondem a uma intersecção de dois telhados de duas águas, um referente ao corpo do edifício longitudinal e outro referente ao remate central da fachada e do alçado posterior.
O edifício organiza-se em três pisos, correspondendo ao piso -1, 0 e 1. O piso -1 corresponde a uma zona de arrumos. No piso térreo situa-se toda a zona de recepção, na zona este do palacete. A Oeste situa-se uma zona privada junto à fachada e uma de serviços a, Norte, com a cozinha. O piso 1 corresponde aos dois quartos principais nos topos do edifício, um pequeno conjunto de quartos e restantes acomodações para serviços.
Voltada a Sul, para o jardim, antecedida de terraço em plataforma gradeada provida de pequena escadaria central. Esta fachada, tal como todas as outras, é revestida de azulejos de padrão com motivos florais estilizados em amarelo, azul e manganês, e percorrida por embasamento de cantaria pouco saliente.
É composta por três corpos, um central de piso único corrido e dois laterais, mais elevados, com dois pisos, separados por pilastras e delimitados por cunhais. No corpo central abre-se um portal em arco pleno, de moldura pétrea, com fecho e enjuntas decoradas, rematada por cornija, tendo de cada lado três janelas de moldura em arco quebrado, providas de guardas de ferro fundido. Sobre os fechos corre um friso liso revestido de azulejos monocromáticos brancos encimado por cornija. Esta é rematada por platibanda revestida por azulejos com motivos de meios-óvulos em amarelo, azul e verde, provida de pilastras que suportam vasos de pedra e pináculos rematados por pinhas. Na zona central da fachada, sobre a platibanda, um grande frontão curvo decorado com filetes em forma de leque, revestido de azulejos azuis e amarelos e rematado por grande vaso de pedra. Sobre o telhado há quatro trapeiras.
Nos corpos laterais, o piso térreo é marcado por um corpo avançado semicircular, vazado por três janelas rectangulares, com fecho estriado, rematado por friso liso revestido de azulejos brancos, encimado por cornija. Nesta assenta a guarda de ferro fundido do terraço para onde abrem as triplas portas-janelas em arco pleno, sobre colunelos, do piso superior. Remate em platibanda idêntica à do corpo central, onde se encaixa um frontão em arco quebrado, de decoração em leque, igualmente revestido de azulejos azuis e amarelos.
Possuem dois pisos, o térreo com duas janelas em arco quebrado e o superior com duas janelas em arco pleno, separados por friso liso revestido de azulejos brancos encimado por cornija, que se repete no remate sob a platibanda idêntica à da fachada principal, com dois vasos sobre os cunhais.
Fachada posterior
Voltada a Norte e composta por um corpo central avançado relativamente aos dois laterais, que apresentam duas janelas em arco quebrado, no piso térreo, duas janelas em arco pleno no primeiro piso e remate em platibanda com pináculos nos extremos. Sobre os telhados existem duas trapeiras.
Nas faces laterais do corpo central abre-se uma porta em arco quebrado e no piso superior uma pequena janela rectangular, num pano de parede contracurvado. A face frontal é marcada, no piso térreo, por uma porta em arco-quebrado ladeada por três janelas do mesmo perfil, encimadas por friso e cornija idênticos aos das restantes fachadas. No piso superior abrem-se três janelões em arco quebrado, o central de sacada com varandim de ferro fundido e as laterais com guardas do mesmo material. Remate em empena angular.
Do lado esquerdo adossa-se um anexo de madeira envidraçado que esconde parcialmente o pano de parede lateral do corpo central e o pano do corpo lateral esquerdo.
AA.VV. – Catálogo de Valiosas Pinturas Contemporâneas Portuguesas, Mobiliário, Antiguidades, etc., Lisboa, Soares & Mendonça, 1971.
BARBOSA, Inácio Vilhena – “Fragmentos de um Roteiro de Lisboa”, in Annuario do Archivo Pittoresco, tomo VI, Lisboa, 1863.
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MOITA, Irisalva – “Cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro no Palácio Galveias”, in Lisboa. Revista Municipal, ano XLVI, 2ª série,nº 14, 4º trimestre de 1985, pp. 36-46.
PROENÇA, Pe. Álvaro – Benfica Através dos Tempos, Lisboa, 1964.
VALE, Teresa Leonor – O Beau Séjour: Uma Quinta Romântica de Lisboa, Lisboa, Livros Horizonte, 1992.
VALE, Teresa e GOMES, Carlos – Quinta das Campainhas / Quinta do Beau-Séjour / Palácio do Beau-Séjour / Gabinete de Estudos Olisiponenses, IHRU, 1993. http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=5597
Séc. XIX
1849 – compra da Quinta das Louras ou das Loureiras por Ermelinda Allen de Almeida, viscondessa da Regaleira, a João Veríssimo de Barros Viana e sua mulher, D. Maria Inácia dos Santos, passando a mesma a designar-se Quinta Beau-Séjour. Foi então construído o palacete por iniciativa da viscondessa, uma casa de Verão rodeada de um jardim romântico, seguindo modelos arquitectónicos de influência anglo-brasileira.
1859 – Isabel Allen Palmeiro, baronesa da Regaleira, sobrinha e herdeira da viscondessa, vende a quinta a António José Leite Guimarães, barão da Glória, um brasileiro abastado, que mandou revestir o palacete com azulejos de estampilha da Fábrica Viúva Lamego.
1876 – por morte do barão da Glória, o Beau-Séjour passou para a posse de seus sobrinhos e herdeiros, José Leite Guimarães e Maria da Glória Leite.
1887 – teve início uma importante campanha de enriquecimento artístico do palacete que durou cinco anos, com intervenções de Francisco Vilaça, Columbano Bordalo Pinheiro, Maria Augusta Bordalo Pinheiro, Rafael Bordalo Pinheiro, Leandro Braga e João Baptista Collomb, entre outros artistas e artífices. Os móveis, tecidos, serviços e instrumentos musicais foram adquiridos em Paris por Francisco Vilaça.
Séc. XX
1930 / 1950 – após passar para a posse de uma afilhada de Maria da Glória Leite e de seu marido, Augusto Fernandes de Almeida, a Quinta das Campainhas, como era então conhecida a propriedade, pelo som de uns sinos pendurados num dos abrigos do jardim, conheceu várias campanhas de obras de beneficiação, permanecendo na posse da família Dias de Almeida até ao início da década de 70.
1971 – leilão do recheio do palacete, constituído sobretudo por pinturas e peças de mobiliário. O edifício foi adquirido pelos Irmãos Maristas que aí instalaram um colégio.
1971 / 1980 – realização de alterações impostas pela nova funcionalidade, como a subdivisão do espaço entre os 2 torreões do 1º andar e o revestimento de vários compartimentos com papéis de parede.
Década de 80 – aquisição do edifício pela Câmara Municipal de Lisboa.
1989 / 1992 – obras de restauro a cargo da Câmara Municipal de Lisboa, sob a direcção do arquitecto Jorge Matos Alves, com a finalidade de adaptar o palacete a instalação do Gabinete de Estudos Olisiponenses: recuperação dos elementos arquitectónicos e decorativos deteriorados; redimensionamento de compartimentos; aproveitamento da área da cave como depósito da biblioteca; transformação da copa e despensa em 2 lavabos; colocação de uma escada metálica no r/c de acesso à cave, no topo nascente; redimensionamento do sótão, em particular do lado norte; restauro das pinturas dos tectos nos antigos salão dourado, sala de jantar, sala de música e galeria ou sala dos quadros, bem como do painel cerâmico contendo o lavabo e do candeeiro da sala de jantar, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro; pintura de paredes, portas, janelas e gradeamentos; recuperação dos estuques decorativos de tectos e sancas; substituição de caixilharia e cobertura da marquise (antiga sala de jogos) e nivelamento do pavimento da varanda que circunda o palacete; recuperação do jardim pela arquitecta paisagista Luísa Ferraz, da Câmara Municipal de Lisboa.
1992 - instalação do Gabinete de Estudos Olisiponenses.
Câmara Municipal de Lisboa: Arquivo de Obras, pº nº 7976
IPPAR: pº nº JN 12/3 (120)
Coordenação: Isabel Mendonça / Helder Carita
Julho de 2014
Autoria dos textos referentes aos campos da ficha:
Isabel Mendonça – Estuques
Lina Oliveira – Arquitectura (Fachadas, Cronologia, Bibliografia) / Azulejaria / Pintura Decorativa / Decoração diversa / Equipamento Móvel
Tiago Molarinho Antunes – Arquitectura (Enquadramento Urbano e Paisagístico, Morfologia e Composição) / Programa Interior
Piso -1
Piso 0
O piso térreo integra um conjunto de divisões ortogonais e apresenta dois tipos de comunicações. À direita, numa zona de recepção, as divisões são intercomunicantes. À esquerda, a comunicação, também intercomunicante, é feita pelo corredor longitudinal, tendo uma única divisão interior junto à fachada que comunica unicamente com o corredor. A entrada principal faz-se a eixo da fachada, para um pequeno corredor que comunica com um vestíbulo na zona posterior. A meio situa-se um corredor longitudinal que acede, nos dois topos, a uma escada em caracol com comunicação ao piso 1. A escada situada à direita, a Sudoeste, comunica com o piso -1.
Piso 1
Piso 0, divisão 3
Piso 0, divisão 5
Piso 0, divisão 6
Piso 0, divisão 1
Piso 0, divisão 2
Piso 0, divisão 4
Nas paredes desta sala, dedicada à música, encontramos flautas de Pan nas enjuntas dos arcos das portas. O tecto é também decorado com temas alusivos à música: um friso de instrumentos de corda (feitos com carapaças de tartarugas e chifres de boi) percorre a sanca. No pano central, dos lados de uma pintura do deus Pan, repetem-se os mesmos instrumentos de cordas, de onde pendem flautas de Pan e grinaldas com folhas de loureiro. Nos quatro cantos do tecto estão figuradas panóplias com instrumentos musicais.
Piso 0, divisão 5
Piso 0, divisão 7
Piso 0, divisão 2
Tecto pintado por Francisco Vilaça, com figuras alegóricas ou musas da Pintura (com uma paleta) e da Escultura (com uma palma, que se repete em relevo fora da tela), acompanhadas de faixas onde estão pintadas medalhas de gosto renascentista, com inscrição alusiva às duas artes e os bustos de Rafael e Miguel Ângelo, guarnecidas de ramos de loureiro.
Piso 0, divisão 3
Tecto revestido com pintura perspectivada em tela de Columbano Bordalo Pinheiro intitulada O Carnaval de Veneza, representando arquitecturas fingidas que se rematam por uma claraboia, vendo-se num balcão cinco figuras trajadas de fatos de máscara barrocos, tocando, cantando e festejando alegremente.
Piso 0, divisão 4
Tecto pintado centrado por medalhão elíptico com figura de trajes esvoaçantes a tocar flauta, enquadrado por faixas com pinturas alusivas à música e instrumentos musicais tocados por máscaras, acompanhando os estuques da mesma temática, de Francisco Vilaça.
Bandeira de arco pintada pelo mesmo autor em trompe l’oeil, com uma herma de figura masculina coroada por um crescente, talvez representando Baco, ladeada por uma criança e uma jovem rapariga que lhe oferecem uma palma, folhas de videira e um vaso.
Piso 0, divisão 5
Piso 0, divisão 12
Piso 0, divisão 1
Piso 0, divisão 2
Piso 0, divisão 3
Porta com moldura de madeira pintada de branco e dourado, formando um arco deprimido de lanços no intradorso, com as enjuntas decoradas com elementos vegetalistas, encimada por frontão curvo sobre consolas inferiormente rematadas por folhagem, duplamente perfilado por óvulos e folhas estilizadas, com florão no tímpano.
Paredes apaineladas com silhar de madeira pintado de branco e dourado formando rectângulos de cantos curvos preenchidos com rosetas, que se repetem nos cantos das molduras dos painéis.
Sanca apainelada, saliente, sobre pequenas mísulas volutadas e guarnecida por friso de folhas estilizadas e florão cantonal no tecto, dentro de moldura triangular curva.
Pavimento em parquet de madeira formando padrão de quadrados perfilados com os vértices entrelaçados, da autoria de João Baptista Collomb.
Lareira de mármore negro com decoração floral e estriada, guarnecida com duplas filas de azulejos brancos e castanhos com elementos florais, embutida numa estrutura de madeira com rosetas cantonais, combinando com o apainelado das paredes.
Piso 0, divisão 4
Portas emolduradas de madeira em arco pleno e paredes apaineladas, atribuídas a Leandro Braga.
Pavimento em parquet de madeira formando padrão de hexágonos entrelaçados e estrelas de 6 pontas, emoldurado com cercadura de duplos meandros quebrados entrelaçados e percorridos por filete, rematado por estrela de 4 pontas entre molduras filetadas em forma de cauda de andorinha. Parquet da autoria de João Baptista Collomb.
Piso 0, divisão 5
Vãos moldurados em arco quebrado.
Lareira em calcário vermelho com pedra lisa de tampo saliente de duplo rebordo boleado, com armação interior de ferro decorada com motivos concheados, vegetalistas e geométricos.
Lustre de cerâmica pendente de grande florão do mesmo, com parras e grandes cachos de uvas, folhagens, frutos e legumes, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro.
Vasos cúbicos de cerâmica relevada com elementos florais, de Rafael Bordalo Pinheiro.
Medalhão circular com busto relevado de Rafael Bordalo Pinheiro em branco, circundado por moldura polícroma de folhas, flores e frutos formando coroa enastrada.
Arcada de madeira em duplos arcos quebrados, com portadas e janelas envidraçadas, com as bandeiras providas de vitrais com motivos florais.
Tecto apainelado guarnecido de sanca com friso relevado policromado com folhas, flores, frutos e legumes, de Rafael Bordalo Pinheiro.
Pavimento em parquet de madeira formando padrão de quadrados filetados, da autoria de João Baptista Collomb.
Piso 0, divisão 6
Grande painel de cerâmica relevada e policromada com lavabo, de Rafael Bordalo Pinheiro, executado pela Sociedade Fabril das Caldas, que apresenta uma composição com pratos de caça, crustáceos, peixes, algas, conchas, rãs, répteis, abelhas, andorinhas e um golfinho em alto-relevo que serve de bica, sobre uma taça em forma de concha, tudo envolvido num enquadramento de folhagens e flores encimado por pé com 3 girassóis e emoldurado por uma cercadura de azulejos relevados com motivos de nenúfares e rãs e friso de malmequeres.
Pavimento de mosaico cerâmico com placas brancas, cinzentas, vermelhas e negras, formando padrão de motivos geométricos com formas estreladas, cruciformes e quadrangulares.
Piso 0, divisão 9
Piso 0, divisão 10
Piso 0, divisão 5
Bufete aparador revivalista com tampo de mármore e uma gaveta; as prumadas são decoradas com azulejos revelados de Rafael Bordalo Pinheiro, figurando folhas de nenúfar alternando com malmequeres; a gaveta mostra escudetes e puxadores em metal amarelo.
Sobre o aparador está colocado um prato circular em cerâmica relevada, figurando o busto de Rafael Bordalo Pinheiro, com moldura de frutos polícromos de gosto della-robbiano; em volta do busto a inscrição: “Raphael Bordallo Pinheiro. Mestre”.