Mário Bragaldi (1809-1873), nascido em Milão, fez estudos em Florença e Bolonha, trabalhou como cenógrafo em Londres e Nova Iorque, onde atuou também como decorador, tendo introduzido o estilo Renaissance, na construção de teatros. (L'Iride Italiana, p. 71), e no armazém de Alexander T. Steaward. Retornou à Itália, para participar dos movimentos revolucionários de 1848 e acabou por se exilar em Londres.
Veio para o Rio de Janeiro em 1854 por sugestão de um amigo tenor, Labocetta, para integrar o Teatro Lírico. Durante sua estada, desempenhou intensa e prestigiada atividade em montagens líricas e teatrais e, a partir de 1856, com o fim de seu contrato, passou a oferecer também seus serviços para decorações domésticas, valendo-se de experiência anterior em "decoração e arquitetura em palácios, quintas, teatros, hotéis e casas de moda na Europa e nos Estados Unidos", conforme anúncio que fez publicar. (Diário do Rio de Janeiro: 1856).
Em 1857, Mário Bragaldi e o arquiteto e engenheiro alemão Theodor H. Marx são contratados para a execução dos serviços dessa nova fase de obras, que contempla, inicialmente, uma ampla reforma no segundo pavimento para a transferência da Sala do Trono para ambiente maior, no lado sul do Palácio, segundo desenhos daquele ano de Mário Bragaldi. Ainda que a proposta não tenha sido efetivada, Bragaldi realizará, ao longo de quatro anos, a decoração das áreas públicas e privadas do palácio, segundo etapas paulatinas, pagas ao final de cada serviço.
Nesse ano, terão início os serviços na Sala dos Diplomatas, que se estendem até março de 1858. As salas do torreão sul, onde estão as dependências íntimas e o gabinete do imperador, tomam os meses de maio a setembro. Entremeios, o arquiteto é requisitado para outros serviços mais prosaicos, como para conserto da cobertura do picadeiro e de um cano de esgoto do “quarto secreto”, possível área destinada à escada de circulação vertical. Em 1859, prosseguem os serviços do torreão sul, de janeiro a agosto; em setembro, tem início o tratamento da Sala do Conselho; e, no mês seguinte, iniciam-se os trabalhos na “sala que vai servir interinamente de Sala do trono”. Nos dois próximos anos, 1860 e 1861, serão desenvolvidos os trabalhos para conclusão da decoração do torreão norte, compreendendo a Sala do Conselho e a Sala do Trono, serviços de estuque na fachada e de pintura do Teatrinho do Paço. A última ordem de pagamento a Mário Bragaldi foi em 28 de agosto de 1861, por “desenhos que fez para a construção do Paço da Boa Vista”.
A Sala do Trono seria o ponto alto do projeto decorativo. Ao concluir o trabalho, Bragaldi deixa, em um canto da solene sala, um inusitado emblema, pintado em trompe d´oeil. No primeiro plano, o escudo com os dizeres “Marcus Bragaldi fecit ad MDCCCLX” sobrepõe o fáscio encimado pelo dragão imperial, ladeado por lanças e estandartes romanos, com D. Pedro II inscrito, e capacetes medievais, entremeados por ramos de café e tabaco, a exemplo da bandeira do Império.
Ele deixaria o pais em seguida aos trabalhos na Quinta. Em 1864, ele estará na equipe da companhia lírica italiana Gran Teatro do Liceo, onde se apresenta como “pintor escenógrafo y arquitecto de S. M, el Emperador del Brasil”.e, a partir de 1869, se instalaria definitivamente em Nova Iorque, onde teria uma bem-sucedida carreira como cenógrafo e arquiteto. Em 1893, o New York Times noticia o seu peculiar funeral: sem representante clerical, o caixão preto, cercado de velas acesas, era ladeado por dois representantes uniformizados da Italian Veteran Association de 1848. Seu ânimo, inquieto e libertário, enfim descansou.
Bibliografia
Diário do Rio de Janeiro, 26 jun. 1856.
L´Iride Italiana. 8 jan. 1856. Ano III, n. 14.
The New York Times July 9, 1869, Oct. 30, 1893.
PESSOA, Ana. Bravo! Bragaldi: o palácio, o artista e a arte no Brasil In: Anais do II Colóquio Internacional Casa senhorial: anatomia dos interiores, 11 a 13 de agosto de 2015, Rio de Janeiro, Brasil / Ana Pessoa, Marize Malta (organizadoras). - Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2015.