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    Jardim do Paço Episcopal de Castelo Branco

    Jardim do Paço Episcopal de Castelo Branco
    Portugal
    XVIII

    Apresentação

    Numa estrutura complexa feita de situações diversificadas, os Jardins do Paço Episcopal de Castelo Branco manifestam-se como uma das realizações mais originais do Barroco em Portugal.

    Desenvolvendo-se em vários terraços, os jardins desdobram - se num conjunto de percursos enquadrados por varandas e escadarias ladeadas por uma profusa estatuária em granito que imprime a todo o conjunto um clima de forte pendor ritualista e processional afecto a um barroco do norte de Portugal.

        

     

     

    Enquadramento arquitectónico e urbanístico

    Em termos arquitectónicos o paço dos Bispos de Castelo Branco ergue-se a partir de um edifício mandado construir por D. Nuno de Noronha ainda como residência de férias do bispo da Guarda. Este facto é confirmado pela inscrição que se encontra no portal de entrada, junto das armas episcopais que regista "Dom Nuno de Noronha, Filho de Dom Sancho de Noronha, conde de O/demira, bispo que foi de Vizeu, sendo o da / Gvarda, mandou fazer estes passos / que se comesarão em Maio /de 96 e se acabarão anno de 1598".

    Já nos finais do século XVIII o edifício sofre uma profunda reforma pela iniciativa do bispo D. Vicente Ferrer da Rocha. Deste período é o notável alpendre com uma estrutura muito original varanda de colunas. Nas          reformas realizadas no seculo XX o paço perdeu a estrutura de entrada em pátio de recebimento murado, sendo o muro substituído por gradeamento de metal e o portal mudado de lugar, solução que destrói toda a lógica de relação do edifício com o exterior e a paisagem.

            

    Fig. 1 - Pormenor da Planta de Castelo Branco levantada por Eng. Joaquim Batista em 1925. Fig. 2 -Fotografia com o portal na sua localização original inscrito no antigo muro do pátio de recebimento do palácio. Fig. 3 –Vista geral da fachada principal. Fig. 4 e 5 – Alpendre de entrada e portal de acesso ao piso nobre.

     

     

    Enquadramento histórico

    Os Jardins do Paço Episcopal de Castelo Branco resultam de uma campanha de obras realizada no primeiro quartel do século XVIII, sob o patrocínio do Bispo D. João de Mendonça (1711–1736). As datas de 1725 e 1726 inscritas em duas estátuas dos jardins testemunham o período de construção deste jardim.

    A data de 1725 encontra-se no pedestal da estátua de São João Baptista, com a inscrição: "Das mulheres não nasceu maior Homem do que S. João Baptista ao qual pregador do deserto João entre todos os mais humilde dedicou este retiro no ano do Senhor de 1725 e 13º doseu episcopado".

    A data de 1726 encontra-se, por sua vez, na inscrição da estátua de Moisés situada no alto da cascata do tanque grande. Em 1771, com a criação da Diocese de Castelo Branco o paço transformou-se em residência oficial do Bispo, tendo o edifício recebido obras mandadas executar por D. Vicente Ferrer da Rocha, segundo Bispo de Castelo Branco. No início do século XX, o jardim foi adquirido pela Câmara Municipal de Castelo Branco, tendo recebido obras de restauro com a construção do patamar de acesso ao terraço central.

          

    Fig. 1 -Retracto de D. João de Mendonça. Séc. XVIII. Fig. 2 - Planta da cidade de Castelo Branco em 1762. Academia de História de Madrid. Fig. 3 - Estátua de Moisés com as Tábua das Leis com inscrição da data de 1726, correspondendo ao final das obras mandadas realizar pelo bispo D. João de Mendonça Fig. 4 - Planta com alterações do terraço de acesso ao jardim assinado por M. Tavares dos Santos, 1936.

     

     

    Morfologia e Composição

    Na sua composição, os jardins estruturam-se com um grande terraço rectangular divido por pequenas alamedas localizadas, três longitudinalmente e quatro transversais, ligando entre si um lago central e quatro lagos secundários. Este grande terraço é bordeado por um percurso em galeria que se desdobra em duas escadarias uma dando acesso ao passadiço de passagem para a horta e outra colocada simetricamente dando acesso ao terraço de Moisés.

    A sul do terraço central localiza-se o jardim alagado com um lago cujo desenho assimétrico e conturbado acusa uma estética rococó da segunda metade do século XVIII. A poente e acompanhando a encosta situa-se o terraço alto que recebe o grande tanque com funções de reserva de água para o período de verão. A nascente e numa cota inferior ao grande terraço central situa-se um terraço de ligação ao exterior e à rua Bartolomeu da Costa que resulta de transformações recentes que abrindo os jardins para o exterior destroem as o espírito e as características originais do jardim.

              

    Fig 2-3 e 4 Vista geral do Terraço central e dois pormenores da escadaria do Apóstolos Fig. 5 Jardim do Labirinto. Fig. 6 - Pormenor do terraço dito de Moisés. 

     

     

    Terraço de São João Baptista

    De planta rectangular, o terraço de aparato constitui-se como grande elemento estruturante de todo o conjunto, sendo enquadrado visualmente por balcões e varandas com estátuas e vasos de flores balaústres de cantaria.

    Na sua estrutura geral o terraço central organiza-se com um lago central e quatro lagos nos cantos, onde se encontram as estátuas das estações do ano, dos continentes, dos quatro elementos, dos signos e das virtudes.

            

    Terraço de São João Baptista dividido com cinco lagos e com um eixo nascente poente marcado a poente pela figura de São João Baptista.

     

     

     

    Estatuária do terraço central

    No terraço de aparato situam-se um conjunto de estátuas que se distribuem ao longo   do caminho que contorna o terraço e à volta do lago central.  Á volta do lago central localizam-se as Virtudes teologais (Esperança, Fé e Caridade) e as Virtudes cardinais (Justiça, Fortaleza, Temperança e Prudência).

    Na entrada e no final do caminho central orientado de nascente a poente e que termina no São João Baptista, localizam-se os quatro continentes Asia, Europa, Africa e América. Na entrada e saída do caminho orientado Norte-Sul, que liga o terraço de aparato ao interior do palácio,   localizam-se as quatro estações Primavera, Inverno, Verão e Outono.

    Nos quatro cantos do terraço central situam-se, por sua vez, os anjos do Juízo, da Morte, do Inferno e do Paraíso. No percurso que circunda o terraço central localizam-se os signos do zodíaco tratados nos doze meses do ano.

    Na entrada dos dois lances que sobem do actual patamar da entrada para o terraço central localizam-se os quatro arcanjos respectivamente São Gabriel, São Rafael, São Miguel e São Uriel (Anjo Custódio).

                  

    Fig. 1 - Arcanjo São Rafael e Anjo Custódio. Fig. 2 –Infante D. Henrique Fig. 3 A Temperança. Fig. 4 - Prudência. Fig. 5 -A Caridade. Fig. 6 -África (Ásia). Fig.7 Ásia Fig. 8 - Fogo

     

     

     

    Passeio dos Reis e dos Apóstolos

    O percurso que atravessa todo o jardim constituído pelo Passeio dos Reis sendo enquadrado por com um conjunto de esculturas dos reis de Portugal, dispostos cronologicamente: Conde D. Henrique de Borgonha, seguido por seu filho, D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, e por seu neto, D Sancho I, e, finalmente, D. José I. Digno de nota os reis da dinastia de Habsburgo são representados a uma escala inferior. Em simetria com a Escadaria dos Reis desenvolve-se a escadaria dos Apóstolos. No patamar inicial situam-se os quatro Evangelistas seguindo-se os doze apóstolos rematados no último degrau por São Pedro e São Paulo.

            

    Fig. 2 - Escadaria dos reis com D. Afonso Henriques e D. Sancho em primeiro plano de costas. Fig. 3 Escadaria dos reis com D. Afonso v e D. João II no primeiro degrau. Fig. 4 Escadaria dos Apóstolos com São pedro e São Paulo em primeiro plano. Fig. 5 - Vista do conjunto da escadaria dos Apóstolos.

     

     

     

    Escadas dos Doutores da Igreja

    Na ligação do patamar central com o interior do antigo paço situa-se um lance de escadas ladeadas por quatro bustos dos doutores da Igreja Santo Agostinho, Santo Ambrósio, São Gregório e São Jerónimo.

            

    Fig. 2 – percurso de acesso ao interior do Paço com ao fundo as Escadaria dos Doutores da Igreja. Fig. 3 e 4 Escadarias dos Doutores da Igreja com Santo Agostinho e e Santo Ambrósio ladeando o primeiro degrau e São Gregório e São Jerónimo no último degrau. Fig. 5 - Busto de Santo Agostinho.

     

     

    Lago das Coroas

    De planta rectangular, o Lago das Coroas, faz a ligação entre o lance de escadas com os reis de Portugal e o lance que sobe. No seu interior o lago é decorado com três repuxos em granito encimados com coroa régia.

          

    Fig.1 e 2 - Vista geral e pormenor do patamar do Lago das Coroas. Fig. 3 – Galeria de ligação às Escadarias do Reis com leão em primeiro plano.

     

     

    Jardim do Labirinto ou alagado

            

    Fig. 2 e 3 Vistas de conjunto do jardim Alagado ou do labirinto. Fig. 4 e 5 pormenor da coroa do lago do labirinto.

     

     

    Terraço do Tanque de Moisés

          

    Fig. 2 -Tanque com reserva de água. Fig. 3 - Espaldar da Cascata de Moisés. Fig. 4 - Pormenor de carranca do espaldar da cascata.

     

     

    Documentos

        

    Postais da 1ª metade do séc. XX, com vistas e pormenores dos jardins.

     

     

    Cronologia e proprietários

    1596 - 1598 - Edificação do paço, destinado a residência de Inverno dos Bispos da Guarda, por iniciativa de D. Nuno de Noronha, segundo inscrição do portal.  Desta época, subsistirá, a "loggia" e algumas estruturas internas, o pátio de acesso ao paço, o pórtico e janelas;

    1608 - Morte do prelado e colocação em hasta pública de certos bens pelo endividamento causado pelas obras, num total de 425$000; o processo foi empreendido pela sua cunhada e herdeira, D. Violante de Castro e visava a horta que ficava fronteira ao paço, três casas adjacentes à mesma e uma tapada com olival, junto ao Convento da Graça; para satisfazer a dívida de 120$000 deixada pelo mesmo enquanto fora prelado em Viseu, foram vendidos, o olival basto e vinha contígua;

    1614, Abril - Compra do olival basto e vinha em hasta pública pelo novo Bispo da Guarda, D. Afonso Furtado de Mendonça, pela quantia de 124$000; 21 Maio - compra dos restantes bens, vendidos por D. Violante de Castro, a Gaspar Correia Barreto, por 437$000, recuperando a totalidade das propriedade que tinham sido vendidas; o bispo adquiriu, ainda, a Sebastião Coelho, quatro casas destinadas a palheiro;

    Séc. XVIII, inícios - Execução de algumas pinturas decorativas, por ordem do bispo D. Frei Luís de Sousa;

    1715 - 1725 - Reedificação do Paço e execução dos jardins por iniciativa do Bispo da Guarda, D. João de Mendonça, segundo desenho de Valentim da Costa Castelo Branco; a cerca integrava os jardins, uma quinta de recreio que incluía horta ajardinada, coelheira, parque de caça, bosque, olival, casa de chá e o passadiço sobre o caminho público; as esculturas são feitas em granito proveniente de Alcains;

    1715, 13 Maio - Contrato com o empreiteiro José da Costa, natural de Caresende, em Torres Novas;

    1771 - Criação da Diocese de Castelo Branco, tornando-se o Paço a residência oficial e permanente dos bispos; o primeiro bispo, D. José de Jesus Maria Caetano;

    1782 / 1786 - Remodelação do Paço, construção do denominado peristilo, da ala N. que integra o salão nobre, da capela dedicada a Nossa Senhora do Rosário, por iniciativa do Bispo D. Vicente Ferrer da Rocha, segundo o risco do dominicano Frei Daniel da Sagrada Família; revestimento dos paramentos interiores com estuque polícromo, colocação de duas conversadeiras no patamar superior; mandou estucar as coberturas e efectuar a galilé; reforma das janelas da fachada norte;

    1807 - Hospedagem das tropas francesas;

    1814 - Inventário dos bens do palácio por D. Frei Vicente Ferrer da Rocha, onde consta a existência de uma maquineta com a representação de São João no deserto, na Sala Grande;

    1831 - Morte do último Bispo de Castelo Branco D. Joaquim José de Miranda Coutinho e início da degradação do edifício; no inventário deste, a maquineta de São João encontrava-se na Sala de Arrás;

    1835 - Instalação do Governo Civil de Castelo Branco no edifício;

    1881 - Extinção da Diocese de Castelo Branco;

    1886 - 0 Governo Civil e Junta Geral do Distrito, instaladas no edifício, são intimadas a sair, pois o bispo pretende instalar-se no local durante as obras a decorrer no Paço Episcopal de Portalegre;

    1910 - Aquisição do edifício pelo Estado; venda dos anexos rústicos ao município; ocorre a criação do Museu Municipal por iniciativa de Francisco Tavares Proença Júnior

    1911 - Instalação da Escola Normal do Magistério Primário, do Liceu Nuno Álvares;

    1934 / 1936 - Instalação da Escola Industrial e Comercial; 1936 - demolição pela Câmara Municipal de uma varanda que permitia vista sobre a quinta, para a feitura do actual acesso;

    1949 - Saída do Liceu Nacional do edifício;

    1955, 1 Agosto - Despacho do Ministro, para que se fizesse a adaptação do piso inferior do edifício a Escola Técnica;

    1958 - Apeamento de uma ala que ameaçava ruína;

    1964 – Instalação do Museu Regional; o jardim foi desanexado do paço, que sofre obras de adaptação, pela DGEMN, adjudicadas pelo empreiteiro Camilo de Amorim;

    1971 - Inauguração do Museu Francisco Tavares Proença Júnior;

    1985 / 1986 - Obras de ampliação, com a construção de um anexo de piso único a O. destinado a oficina de lavores, sendo autor do projecto Florindo Belo Marques, sendo empreiteiro Manuel Lourenço Gonçalves;

    2005, 18 abril - Proposta da DRCastelo Branco para abertura de um processo de classificação que abrangesse os jardins, a horta e o Bosque dos Loureiros, atual Parque da Cidade;

    2006, 01 Junho - Despacho de abertura do processo de classificação dos jardins do vice-presidente do IPPAR;

    2007, 29 Março - 0 imóvel é afeto ao Instituto dos Museus e Conservação, I.P. pelo Decreto-Lei n.º 97/2007, DR, 1.ª série, n.º 63;

    2012, 11 Janeiro - Parecer do Conselho Nacional de Cultura a ampliar a classificação como Monumento Nacional;

    2013, 05 Junho - Arquivamento do processo de ampliação da classificação do edifício, de forma a abranger os jardins, a horta e o bosque dos loureiros, por este se encontrar muito descaracterizado, em Anúncio n.º 200/2013, DR, 2.ª série, n.º 108;

    2013, 29 Outubro - Publicação da abertura do procedimento de ampliação da classificação de modo a incluir o Jardim Episcopal e o passadiço, em Anúncio n.º 334/2013, DR, 2.ª série, n.º 209;

    2016, 26 Dezembro - Anúncio de abertura do procedimento concursal para a beneficiação e conservação dos edifício, em Anúncio de procedimento n.º 8463/2016, DR, 2.ª série, n.º 246;

    2017, 10 Outubro - Publicação do Projeto de Decisão relativo à ampliação da classificação como Monumento Nacional do Paço Episcopal de Castelo Branco, de modo a incluir o Jardim Episcopal e o passadiço, em Anúncio n.º 176/2017, DR, 2.ª série, n.º 195/2017;

    2018, 18 maio - Publicação da ampliação da área classificada do Paço Episcopal de Castelo Branco, passando a incluir o jardim, em Decreto n.º 15/2018, DR, 1.ª série, n.º 96/2018.

     

     

    Bibliografia

    AZEVEDO, Leonel, RIBEIRO, João, Os Jardins do Paço Episcopal de Castelo Branco, Castelo Branco, Ed. CMCB. 2001.

    CARITA, Helder e Cardoso, A. H., Tratado da Grandeza dos Jardins em Portugal, Lisboa, 1990.

    CASTEL-BRANCO, Cristina, O lugar e o significado, os jardins dos vice-reis, Dissertação de Mestrado, Instituto Superior de Agronomia, Lisboa, 1992.

    LEITE, Ana Cristina, O Jardim em Portugal nos séculos XVII e XVIII, Tese de Mestrado. Universidade Nova, lisboa, 1988

    PEREIRA, Paulo (dir.) “A Arte dos Jardins. O Jardim Barroco”, in História da Arte Portuguesa, vol 3, Lisboa, 1995, pp. 213-231.

    SILVA, P. R, da Jardim do Paço – novos contributos para o estudo dos recreios episcopais de Castelo Branco, Castelo Branco, 2001.

     

     

    Nota

    Coordenação: HélderCarita

    Textos: Hélder Carita

    Colaboração na inserção de textos: Bolseira Magda Salvador

    Fotografias: Atelier Hélder Carita

     

     

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    PTCD/EAT-HAT/11229/2009

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