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    Escritorio Mogol, séc. XVII

    Escritorio Mogol, séc. XVII
    Goa
    XVII

     

    Introdução

    Para além dos cofres e caixas em ouro, prata, marfim, tartaruga ou madrepérola, os escritórios foram as peças mais luxuosas, com as decorações mais originais, que nos chegaram da Índia. Uma decoração plena de simbolismo, cuja memória foi esquecida com o passar dos séculos.

    Este escritório pertence a uma tipologia que por vezes se designa por contador de mesa ou contador de pequenas dimensões, quando na realidade o tampo rebatível servia de plano de escrita e as gavetas guardavam todos os acessórios ligados à escrita: papel, canetas, lacre, tinteiros, etc. Uma outra tipologia é designada por caixa-escritório e tem tampa de abrir, podendo ter ou não gaveta(s) e compartimentos para guardar os acessórios de escrita.

    A chegada destas peças à Europa está ligada à rede comercial portuguesa e ao interesse pelo colecionismo que os membros da nobreza e das monarquias europeias mostraram nos séculos XVI e XVII. O gosto de reunir objetos exóticos para os Gabinetes de Curiosidades, potenciou a atividade comercial do império português.

     

     

     

    Identificação

    Proprietário: Fundação das Casas de Fronteira e Alorna; Coleção da Sra. D. Margarida George (Mãe de D. Fernando Mascarenhas, 12º Marquês de Fronteira).

    Número de Inventário: CTD – 0143

    Classificação: Mobiliário de conter e de aparato.

    Denominação: Mobiliário/Escritório.

    Local de Produção: Índia.

    Autoria: Desconhecida.

    Datação: Século XVII.

    Estilo: Indo-português, vertente Mogol.

    Materiais: Teca (Tectona grandis L.f.), sissó (Dalbergia sissoo Roxb.), marfim, metal.

    Técnicas decorativas: Marchetados e embutidos.

    Dimensões: altura – 26,5cm; profundidade – 30,5cm; largura – 38,5cm.

    Localização: Palácio Fronteira; Sala Juno.

       

    I - Frente/Batente. (DSC.09),  II -  Ilharga esquerda (DSC.10), III - Ilharga direita (DSC.13

       

    I - Tardoz (DSC.11),  II  -  Tampo. (DSC.14), III -  Fundo. (DSC.15copy)

     

    I - Gavetas. (DSC.15), II - Interior do Batente. (DSC.19)

     

     

     

    Técnicas construtivas

    As técnicas de construção da caixa, batente e gavetas, tanto quanto podemos observar, serão as mesmas que se utilizavam naquela época.

    (DSC.21)

    A Caixa é composta pelo tampo, base, ilharga direita, ilharga esquerda e tardoz. Tradicionalmente as samblagens em cauda de andorinha ligam a base, ilhargas e tampo. O tardoz está ligado ao tampo, ilhargas e base por malhetes em castelo.

    Os entrepanos e as divisórias são normalmente ligados entre si por malhetes em castelo, à meia-madeira.

    A Fábrica é constituída pelas gavetas, nichos ou escaninhos.

    A Base ou Fundo é constituída por um engradado, composto por quatro travessas unidas em furo e respiga, tendo um rebaixo no interior onde encaixa um painel.

    O Batente será certamente formado por uma placa de madeira revestida com os materiais da decoração. A sua ligação à caixa faz-se por meio de duas dobradiças. No exterior do batente, em baixo há dois pregos de cabeça, provavelmente não originais, talvez para proteção dos embutidos ou apoio do batente, com a finalidade de aliviar a pressão nas dobradiças.

    As Gavetas em número de seis, sendo que a gaveta em cima ocupa o espaço de três gavetas, e a gaveta central o de duas. A sua construção com malhetes de fora a fora na ligação dos lenços ao tardoz e malhetes semiescondidos na ligação dos lenços à frente da gaveta.

    O fundo das gavetas prolonga-se para além do tardoz para servir de batente. O fundo está colado à frente, tardoz e lenços da gaveta.

    Os puxadores das gavetas são em latão. 

     

     

     

    Técnicas decorativas

       

    A estrutura está totalmente revestida e decorada (com exceção do tardoz). Foram usadas duas técnicas: de embutidos e marchetados. A técnica de embutir consiste em recortar determinados motivos, previamente desenhados, numa madeira ou outro material contrastante com a madeira de base, e inseri-los nas aberturas correspondentes.

    A técnica de marchetados produz um efeito semelhante ao dos embutidos, mas difere no facto de o motivo ser recortado em duas faixas sobrepostas, introduzindo na faixa de base o motivo recortado na faixa de madeira contrastante.

    Marfim gravado e cavilhas em marfim.

     

     

     

    Estado de Conservação

    Vermelho-faltas Azul -defeitos

       

    O estado de conservação desta peça é médio. Para além das pequenas faltas e defeitos, inerente a uma peça com quatrocentos anos, e que assinalamos no esquema, apresentamos três imagens elucidativas desses problemas: da esquerda para a direita, o preenchimento com betume à volta da fechadura do batente, o puxador central da primeira gaveta em falta, faixa de uma gaveta em destacamento.

     

     

     

    Descrição do escritório

         

    I - Frente: O recorte das molduras de marfim define reservas no espaço faixeado a sissó. Um filete em marfim a toda a volta da estrutura, e um duplo filete que delimita o espaço exterior do batente. No interior deste duplo filete uma moldura em curva e contracurva unindo-se à direita e à esquerda ao duplo filete, como um arco islâmico. No interior deste espaço uma outra moldura diferente, mas do mesmo tipo, com o espelho da entrada de chave em cima que não parece ser o original, em baixo um motivo que se assemelha a duas meias luas afrontadas e, dos lados direito e esquerdo, um motivo que parece uma flor em forma de cruz.

    II - Tampo: No tampo podemos observar os mesmos motivos geométricos, com algumas exceções. Os limites são feitos por um duplo filete em marfim, seguido de uma moldura com pequenas flores simétricas, e por fim um outro filete paralelo ao duplo filete. As molduras geométricas são semelhantes às do batente, com os mesmos motivos, exceto as flores à direita e esquerda que, aqui, se encontram abertas e têm a mesma configuração das meias luas, de costas uma para a outra, tendo no meio uma pequena flor.

    III - Ilharga esquerda, IV - Ilharga direita: Nas ilhargas o mesmo duplo filete que delimita o espaço e, no seu interior, uma moldura simétrica, ligeiramente retangular, para acompanhar o espaço e, no interior desta, uma outra moldura simétrica, desta vez de forma mais quadrangular, que apresenta quatro pequenas flores de cinco pétalas, em cima, em baixo, à direita e à esquerda. No seu interior, foi colocada a gualdra, que tudo indica ser a original.

     

      

    I - Interior - Gavetas: No interior, as gavetas (excetuando a gaveta central) estão embutidas em marfim, com um motivo figurativo: uma árvore da vida ao centro e dois pássaros afrontados de cada lado.

    II - Gaveta central: A gaveta central apresenta uma decoração mais complexa, com uma moldura em baixo com motivos fitomórficos, na qual se apoiam duas urnas, unidas na parte superior por um filete reto e um outro em arco de volta perfeita. Entre as duas urnas uma flor aberta. No canto superior direito o sol e no canto superior esquerdo a lua em quarto crescente.

    III - Batente: No interior do batente, também delimitado por um duplo filete em marfim, o espaço está dividido ao meio, tendo ao centro uma árvore da vida com um pássaro e em cima uma flor, que funciona como eixo de simetria. De cada lado, esquerdo e direito, temos uma árvore da vida ladeada por duas figuras afrontadas, vestidas ao modo persa. Também esta árvore tem um pássaro encimado por uma flor.

     

     

     

    Bibliografia

    DIAS, Pedro, Mobiliário Indo-Português, Moreira de Cónegos, Imaginalis, 2013.

    FERRÃO, Bernardo, Mobiliário Português - India e Japão, volume terceiro, Lello & Irmão - Editores, Porto, 1990.

    NEVES, José Cassiano, Jardins e Palácio dos Marqueses de Fronteira, Lisboa, Camara Municipal de Lisboa, 1953.

     SANTOS, Reynaldo dos, Oito séculos de Arte Portuguesa - História e Espírito, Lisboa, Editorial Notícias, 1970.

    SILVA, Maria Madalena de Cagigal e, A Arte Indo-Portuguesa, Lisboa, Edições Excelsior, 1966.

     

    Observações

    Texo Maria do Céu Medeiros, 2019

     

    ttt
    PTCD/EAT-HAT/11229/2009

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