Enquadramento histórico e paisagístico
Ocupando um lugar emblemático no programa paisagístico da Quinta da Bacalhoa, a Casa do Lago também chamada Casa de Fresco, ganha uma clara monumentalidade na sua articulação com o grande lago que reflecte em espelho de água o alçado poente do palácio. Neste programa tanto a Casa do Lago como o edifício residencial situam-se na zona de cota mais elevada assumindo uma posição dominante sobre os jardins e as zonas de pomar e vinha que se prolongam em declive pelo Vale de Azeitão. Da história da quinta sabemos que no século XV esteva ligada á casa real primeiro com o infante D. João e com os duques de Beja, D. Brites e D. Fernando pais do rei D. Manuel I. Adquirida em 1528 por Brás Afonso de Albuquerque, filho do grande conquistador do Oriente, a quinta e palácio sofrem uma intensa reforma que estaria acabada pelo ano de 1554, data que se encontra na inscrição sobre a porta de entrada. Pelas suas características e por um cronograma de painel de azulejos, as obras da Casa do Lago ter-se-ão desenrolado, um pouco mais tarde, entre 1560 a 1565, sendo este último ano assinalado no painel de azulejos com a cena de Susana Surpreendida pelos Velhos.
Morfologia e composição
Na sua composição arquitectónica a Casa do Lago da Quinta da Bacalhoa estrutura-se com três pequenos torreões iguais articulados por dois corpos em galeria. Os torreões, rematados por telhados de quatro águas, apresentam volumes sólidos e opacos que se contrapõem-se com as duas galerias de sentido mais delicado e transparente. De ordem toscana as duas galerias são formadas com arcos de volta perfeita assentes em colunas de pedra de delicadas proporções apresentando sobre o lago um murete baixo que estabelece uma ligação de forte sentido lúdico.
Muro-chafariz
Elementos de composição, portais e portas
Nos elementos arquitectónicos destacam-se dois portais com molduras em pedra rusticada e almofadada, uma que dá entrada ao jardim murado e uma segunda que, no torreão central, dá acesso a um pequeno ancoradouro em meia laranja que outrora permitia o acesso ao batel gôndola para passeio no lago. Nos dois torreões dos extremos do alçado recortam-se duas janelas de sacada com molduras de aresta redonda características do Renascimento português.
Jardim horto
Servindo de pátio de entrada ao interior da Casa do Lago este pequeno jardim funciona como espaço de transição entre o exterior e o interior. Rodeado de altos muros com quatro alegretes, este espaço guarda um clima de grande privacidade de clara tradição medieval vinculada aos hortos.
De uma notável qualidade pictórica são os pequenos painéis de azulejos guarnecendo as faces dos alegretes com figuração de grotescos do mais puro gosto flamengo. Embora muito danificados na zona central alguns painéis mais preservados decompõem-se numa temática de cartelas, faunos, vasos de frutos e flores, fitas e pássaros, mostrando clara inspiração nas gravuras de Vredeman de Vries que no século XVI circularam por toda a Europa.
Programa interior
Antecâmara
De proporções quadradas esta sala constitui o início de um conjunto de cinco compartimentos alinhados rigorosamente em enfilade numa sequência de cinco portas.
As paredes são forradas a toda a superfície com azulejos de padrão num esquema radial com tonalidades, azul, amarelo, verde cobre e roxo.
Verdadeiramente notáveis são os rodapés constituídos por uma faixa de um azulejo com decoração de grotescos com sereias e grifos de traço muito fino e delicado.
Galeria da Justiça e da Prudência
Esta galeria que segundo a documentação do século XVI se chamaria varanda apresenta uma planta em duplo quadrado em clara alternância com as salas dos torreões de planta quadrada.
A justiça e a Prudência articulam-se por sua vez com a Fortaleza e a Temperança constituindo as quatro virtudes capitais referidas por Platão. Existia um painel que desapareceu totalmente ficando no entanto o alvéolo. A parede que faz contraponto com a arcaria é revestida de azulejos mudéjares em aresta encomendados em Sevilha. De proveniência andaluza a aplicação dos azulejos em diagonal revela um sentido arquitectónico de toda a azulejaria portuguesa cm grande sensibilidade aos efeitos espaciais.
Salas dos painéis
No seu conjunto as paredes apresentam-se forradas de azulejos de padrão de produção portuguesa num esquema radial com tonalidades, azul, amarelo, verde cobre e roxo.
Integrados nas paredes forradas a azulejo recortam-se três painéis com 8x14 azulejos , representando o Rapto de Hipdémia,, uma potomaquia o Rio Tejo e a cena de Susana Surpreendida pelos Velhos, este ultimo em relativo bom estado de conservação apresenta o cronograma de 1565.
O rapto de Hipódemia é realizado com base numa estampa de Aeneas Vico datada de 1542. A Susana e os Velhos também é realizada com base numa estampa de Aeneas Vico reproduzindo, por sua vez, um quadro de Jian Metzijs hoje no Museu de Bruxelas.
Galeria da Temperança e da Fortaleza
Em consonância com a sala galeria dedicada à Justiça e Prudência este compartimento apresenta as paredes revestidas de azulejos mudéjares em aresta encomendados em Sevilha. Diferente da galeria varanda dedicada à Justiça e Prudência esta sala ap. De proveniência andaluza a aplicação dos azulejos em diagonal revela o sentido arquitectónico de toda a azulejaria portuguesa com grande sensibilidade aos efeitos espaciais.
Na parede virada ao lago integra-se uma composição heráldica em azulejo com ao centro as armas dos Albuquerque. A cartela onde as armas se inscrevem apresenta uma estética quinhentista de influência flamenga na linha dos azulejos do jardim-horto e dos rodapés da primeira e quinta sala. A técnica e o vidrado apontam porém para uma manufactura do século XIX, reproduzindo o desenho original.
Com azulejos de aresta
A Fortaleza e a Temperança articulam-se por sua vez com a justiça e a Prudência que vemos na primeira varanda constituindo as quatro virtudes capitais referidas por Platão.
Trascâmara
Ultimo compartimento da sequência da chamada Casa do Lago apresenta uma planta quadrada com uma porta de entrada com moldura de lioz, janela de sacada sobre o lago com guarda em ferro forjado quinhentista e uma janela de peito com duas conversadeiras
repete a decoração do primeiro compartimento da entrada com as paredes forradas de azulejos flamengos de padrão num esquema radial com tonalidades, azul, amarelo, verde cobre e roxo.
Muito idênticos à primeira sala, os rodapés são constituídos por uma faixa de um azulejo com decoração de traço muito fino e delicado de grotescos com sereias e grifos.
Bibliografia
Rasteiro, Joaquim, Quinta e Palácio da Bacalhoa em Azeitão, Lisboa, Imprensa Nacional, 1895
Santos Simões, J. M., Azulejaria em Portugal nos séculos XV e XVI. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1969.
Cronologia e Proprietários
1427 - compra da quinta por infante D. João
1442 – Dona Brites herda a quinta e casa com o Infante D. Fernando filho de D. Duarte e irmão de D. Afonso V.
1506 D. Brites de Lara sucede na posse da quinta por morte de sua bisavó e casa com o 3º Marquês de Vila Real.
1528 - Brás ou Afonso de Albuquerque, filho compra quinta e faz grandes obras de beneficiação
1585 - D. João Afonso de Albuquerque é constituído 2º morgado e vem residir para Azeitão
1613 - 3.° Jerónimo Manuel o “Bacalhau” entra na posse da quinta como 3º morgado
4.° morgado D.ª Maria de Mendonça e Albuquerque;
5.° morgado D.ª Jorge Manuel de Albuquerque;
6.° morgado D. Jerónimo Afonso de Albuquerque;
1658 - entra na posse da quinta como 7.° morgado D. Francisco Sebastião de Albuquerque;
1677 - Luís de Mendonça Furtado e Albuquerque herda o 8.°morgado
1692.- Nuno de Mendonça Furtado e Albuquerque entra na posse da quinta como 9º morgado
1684 - 10.° D.ª Maria Josefa de Mendonça e Albuquerque casada com pedro Guedes de Miranda Henriques senhor de Murça
11.° morgado Luís Guedes de Miranda e Albuquerque;
12.° morgado João Guedes de Miranda e Albuquerque;
13.°morgado Luís Guedes de Miranda e Albuquerque;
14.° morgado Manuel José Guedes de Miranda Henriques ;
15.° morgado -D. António José de Melo Homem;
1785 – herda a quinta D. José Francisco da Costa e Sousa de Albuquerque Armeiro Mor, como 16º morgado da casa
1802 - 17.° D. Luís da Costa de Macedo e Sousa e Albuquerque, herda a casa e é 17 morgado da Bacalhoa tendo recebido o titulo de 1º conde de Mesquitella em 1818
1853 - herda o morgado a casas o 18.° morgado D. João Afonso da Costa e Macedo de Sousa e Albuquerque.
1890 - D. Luís António da Costa Macedo de Sousa e Albuquerque, 3º conde de Mesquitella herda a casa sendo 19.° morgado.
1903 - compra do palácio por D. Carlos à família Mesquitela, descendente dos Albuquerques; 1910, 16 junho - decreto classifica apenas o palácio da Bacalhoa; 1924 - palácio e quinta muito arruinados (tinha desaparecido a galeria virada a SO.) (PROENÇA, 1924);
1937- Orlena Scoville, americana, compra a quinta e faz importantes obras de restauro a cargo do arquitecto Norte Júnior e do engenheiro hidráulico Santos Simões
1996, 06 março - decreto n.º 2/96, DR, 1.ª série-B, n.º 56, altera a designação para palácio e quinta da Bacalhoa; 13 maio - declaração de retificação n.º 10-E/96, DR, I série-B, n.º 127, retifica o distrito indicado no diploma de classificação anterior; 13 novembro - Portaria n.º 255/96, DR, 1.ª série, n.º 263, amplia a Zona Especial de Proteção à quinta;
1997 - Thomas Scoville, neto de Orlena Scoville e proprietário do Palácio e quinta põe o conjunto à venda;
2000 - O palácio e quinta são comprados por Joe Berardo, através da Sociedade Anónima Matiz S.A. São realizadas várias obras, nomeadamente no jardim.